A forma circular e cíclica, como observo nas fases da lua, mostra que o ciclo se fecha em si e dobra-se sobre si.
Imagino as bordas, que conforme ficam visíveis em cada uma das fases, seguem fechando-se em forma circular e, imediatamente após completar o círculo, abrem-se, dissolvendo-se.O meu processo cognitivo, de aprendizado e desenvolvimento das emoções ocorre como as fases da lua: vou circundando um sentimento abstrato, absorvendo-o em todos os seus aspectos e, uma vez que eu consiga integrá-lo, o círculo se fecha, para que possamos nos fundir e também nos fragmentar.
Instintivamente, algo será mantido e algo será solto.
O que for solto, pode ser resíduo tanto do sentimento, quanto de algo inútil ou danoso que eu já portava, de forma consciente ou inconsciente.
Incorporar as emoções permite reciclar ideias, oxigenar velhos hábitos, este processo todo faz com que eu possa me reconfigurar e ressignificar.
Muitas emoções chegaram para mim assumindo o importante papel de remontar cacos e curar pedaços quebrados.
Artistas e gênios possuem a habilidade de, durante esta fusão, suspender os demais sentimentos, se entregam tão profundamente que acabam por transpor a barreira que divide o mundo ideal do físico, e conseguem exteriorizar e materializar este processo, criando obras, pinturas, canções, poemas, romances.
Li esta frase do físico Giorgio Parisi e, a princípio, a acolhi sem saber bem o lugar dela em mim, mas ela revelou-se enquanto eu voava livre nesta experiência:
“Em física e em matemática é impressionante a desproporção entre o esforço para compreender uma coisa nova pela primeira vez e a simplicidade e a naturalidade do resultado […]. No produto acabado, tanto nas ciências como na poesia, não há vestígio do esforço do processo criativo e das dúvidas e hesitações que o acompanham.”
Sempre tive dificuldade para expressar minhas emoções e sentimentos, e muitos processos foram tão devastadores que, hoje, percebo que escrever poesias foi o que me manteve apenas flertando com a ideia de suicídio.
Fez lembrar Cioran em Silogismos da Amargura: “Só vivo porque posso morrer quando quiser: sem a ideia do suicídio já teria me matado há muito tempo.”
Este processo, de encerrar tanta potência em um núcleo gerou o universo, faz com que a semente se abra e com que a célula se divida, e este mesmo processo ao findar, com a morte de todas as coisas, inicia-se simultaneamente.
Está em tudo que é biológico, tudo que é natural é cíclico.
Por gostar de criar, gosto de plantar. Ver a semente germinar, virar broto, do broto virar mudinha, da mudinha virar flor, da flor virar fruto.
Mas, não basta só plantar não, colocar a semente em uma terra deficiente em sua composição, abandonar o broto em um ambiente impróprio para ele, sem atentar-se às suas necessidades para desenvolvimento.
Algumas sementes brotam mesmo nas piores condições, como em uma terra incapaz de prover o enraizamento, ou em um ambiente com o mínimo para seu precário desenvolvimento.
A semente carrega ancestralidade, existem gerações e evoluções anteriores contidas em seu DNA, de maneira que as flores e frutos em sua maioria serão uma simulação genética de seus exemplares passados.
Nem toda semente germinará em broto, nem todo broto chegará a ser mudinha, nem toda mudinha chegará a ser flor, nem toda flor chegará a ser fruto.
As raras sementes que germinam nas piores condições, sem investimentos, gerarão frutos incríveis, pois doarão tudo que tiverem, evoluirão para superar as dificuldades e o abandono e poderão gerar frutos com novas inscrições genéticas, com forças desconhecidas anteriormente. Essas sementes, gerarão exóticos exemplares, complexos e maravilhosos.
Esta minha percepção circular estendeu-se recentemente sobre a ideia do que é o amor, do significado místico das almas gêmeas e dos signos.
Justo eu, que nunca dei crédito para simbolismos como estes, fui inundada por alegorias e imagens, incógnitas que se revelaram da maneira que as coloco aqui.
Primeiro é preciso entender a relação do que temos como tempo, espaço e existência.
Se tudo é circular, a nossa existência não se condiciona ao que concebemos tão fragilmente como tempo. Até mesmo a expressão “existência” não é adequada. Pensemos em consciência como algo não material, quase infinito e quase indestrutível. Uma energia que transita livremente no espaço tempo, e que pode materializar-se em qualquer época e lugar.
Essa alma, por assim dizer, vaga entre as eras, morre e nasce constantemente, em formas, tempos e condições diversas, sempre. A física já provou inúmeras vezes que nada some simplesmente, que toda a energia se transforma, se renova, se realoca, e nossa consciência é igualmente energia. A morte seria nada mais que a transmutação de energia, a oportunidade aleatória desta consciência materializar-se novamente.
Penso que as almas gêmeas são consciências que sempre se encontram quando se renovam., em todas as eras, sempre juntas. Então poderiam ser, em algum momento do tempo e espaço: amantes, mãe/pai e filho/filha, irmãos/irmãs, mas nunca inimigos cruéis, porque o ódio não possui força o suficiente para “dobrar o espaço e tempo” e permitir esse encontro, só o amor consegue, o ódio é um sentimento pequeno, doente em si, ele é fraco demais para romper as barreiras metafisicas.
Pensando novamente na questão circular, acredito que as almas gêmeas que se encontram como amantes são o ápice da concepção de amor, pois não se condicionam a laços sanguíneos ou laços familiares, nem são almas flageladas que precisam curar um ao outro, são almas pertencentes integralmente, uma à outra.
Deixando qualquer fardo religioso de lado, sugiro o filme “Amor além da vida”, que seja visto e revisto sem preconceitos e sem pretensões.
Quando soube que estava grávida foi um tipo de amor que nunca senti, foi como acolher uma alma ferida, uma alma que precisava de mim. Os anos passaram e eu pude perceber que foi ele quem me acolheu, eu precisei ser melhor, eu precisei quebrar os ciclos que vieram antes dele. Mas, por maior que seja este amor, eu sinto que esta alma não me pertence, eu não sinto que iremos nos encontrar novamente, essa certeza faz com que eu queria viver este amor intensamente, desmedidamente, e talvez seja até por isso que eu o viva dolorosamente as vezes.
Ele é fruto da fusão de duas almas gêmeas, ele é uma alma gêmea nova, que buscará e encontrará eternamente sua própria alma gêmea. Para mim, é assim que as almas gêmeas são criadas.
Estranhamente, somos os três do signo de peixes, Thi, Dudu e eu, o último signo do zodíaco, a última “reencarnação” possível.
Eu, uma alma imperfeita como me vejo, sendo acolhida em meu pior momento, em minha versão mais sombria, ensinada a amar, me vi capaz de amar como ele ama, capaz de doar mais que receber, para tantas outras almas, mas em especial para ele e para nosso fruto, cuja alma pertence a ele, como a minha. É uma quimera, pertencer e doar-se assim, para duas almas.
Minha alma gêmea, neste encontro em que estamos, é o reflexo do amor além da vida, somos duas almas antigas, mais antigas do que o tempo em que estamos, nós iremos eternamente buscar um ao outro no espaço tempo e certamente nos encontraremos. No encontro atual, minha alma gêmea me resgatou, é meu protetor, e espero que eu já tenha feito por ele pelo menos um pouco do que ele faz por mim hoje, ou que eu tenha a oportunidade de, quando nos encontrarmos de novo, fazer tudo que eu puder por ele, como ele faz por mim.
Myrna Minetto